julho 21, 2013

Fiança

Querido Futuro

Espero que te encontres bem.

Escrevo-te directamente do Presente. Aproveitei um momento em que ninguém me estava a observar, surripiei um papel e uma caneta... E eis-me a redigir esta carta. Prometo ser-te breve e concisa. Também não quero ser apanhada.

Estou aqui presa, como sabes. Não te consigo precisar há quanto tempo, mas tenho noção que é o tempo suficiente para concluir que não estou bem. Não tenho cuidado de mim ultimamente; confesso que não tenho tido forças para isso. Olho para o espelho e dificilmente me reconheço. Sinto-me envelhecida, disforme, pesada. Vejo o meu cabelo quebradiço, um rosto que está a perder vida... Sofri recentemente uma entorse no pé e, apesar de já ter saído do período de convalescença, não creio que esteja totalmente recuperado. Tem um aspecto feio... Para piorar, há uma dor de dentes que me anda a atormentar...

Como já te apercebeste, o panorama não é nada bom. E todos os dias, a situação se repete: acordo, saio da cela, tomo a primeira refeição do dia, cumpro com as tarefas estipuladas, chega a pausa para almoço, volto às tarefas, pausa para jantar e regresso à cela. A rotina é a mesma de sempre, mecanizada. As tarefas são as mesmas de sempre, as pessoas ao meu redor são as mesmas de sempre. Já para não falar da comida... O meu organismo fica intoxicado, conspurcado com tanta porcaria. Se eu já não a saboreava com prazer, agora com a dor de dentes, muito menos... E nem um protesto me é permitido. Ai de mim que reclame!...

A minha cela vai-se tornando cada vez mais pequena, e o ar cada vez mais viciado e irrespirável. Não tenho companhia, ou ao menos um calendário para ir riscando. Não cheguei a trazer fotos para aqui. Mas trouxe memórias, o que basicamente vai dar ao mesmo, com a diferença de que não são palpáveis. Raras são as vezes em que recebo visitas... Já não suporto estar aqui dentro. Aliás, eu nem sequer suporto estar dentro de mim...

Prometi no início desta carta que te seria breve e concisa. Portanto, não querendo tomar muito mais do teu tempo, deixa-me ir directa ao assunto.

Sei que vais achar isto uma loucura... Mas preciso que me pagues a fiança o mais rapidamente possível. És o único que a poderás pagar. Infelizmente, não estou autorizada a sair em precária. Também não me interessam liberdades condicionais. Quero sair com a plena certeza de que, faça o que fizer (e não farei nada de mal, para que conste, muito pelo contrário), não voltarei a este lugar. Esta cadeia é horrível, acredita!... E eu não mereço cumprir esta pena. Eu não matei ninguém, eu não roubei. Fui injustamente condenada...

Por favor, Futuro... Chega mais cedo. Peço-te! Ajuda-me, porque não aguento mais! Dá-me um sinal... Liberta-me! Estou dependente de ti... E há alguém que também o está... Alguém que está lá fora, à minha espera.

Um beijo

Dina

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