junho 28, 2013

Foto Tipo Passe

Descobri-a acidentalmente. Uma foto tua, tipo passe, camuflada no pó, escondida dos olhares. Com ar de ser antiga, embora bem conservada. Eras tu, com alguns anos a menos. Uma vintena deles, suponho.
Tinhas um aspecto sereno e compenetrado ao mesmo tempo. Rosto alvo, de feições delicadas e limpas. Usavas fato e gravata na altura, a barba desfeita, um penteado aprumado. Tudo composto para a ocasião do "flash".
Não sei em que contexto a tiraste, mas deixa-me dizer-te que eras incrivelmente bonito. Belo, mesmo. Acredita... Pois, não acreditas. Achas que é tudo uma grandessíssima "tanga" minha. Acha pois o que quiseres e o que bem entenderes. Não me vais conseguir tirar essa opinião do pensamento e, por conseguinte, da minha boca.
Os anos passaram por ti e isso é um facto. Os anos que te trouxeram experiências, etapas, mil e um estados de alma que se resumem ao senti-la nos píncaros da existência suprema ou no mais profundo subsolo de tudo o que é negativo neste mundo. Os anos que te trouxeram pessoas e os respectivos laços, próximos ou não. Que te trouxeram lugares, os de passagem e os fixos. Os anos que fizeram de ti a pessoa que és hoje.
A vintena deles que separa a foto do presente marcaram-te o rosto. Tornaram-no menos alvo; as suas feições fragilizaram-se. Parto do princípio que tu aceitaste tudo isso com naturalidade. E o que se viveu está vivido... Não há como inverter o processo. Eu também não irei para nova... Haverão estragos à minha espera.
Mas também parto do princípio que de alguma forma, ainda estará aí dentro o rapaz que vi na fotografia. A sua energia, sagacidade, curiosidade, as suas ganas de tudo. E, creio eu, algures debaixo de uma forte camada de comodismo, medo, insegurança, descrença, que foste construindo nesses anos todos que passaram. Uma camada terrivelmente grossa que o sufoca, que não o deixa respirar.
Deixa-o submergir. Não o confines a um quadrado de papel. Ele é demasiado tu para estar apenas ali. Não o remetas para uma memória remota do teu ser. O que se viveu está vivido... Mas ainda há mais para viver.
E deixa-me que te diga: continuo a achar-te incrivelmente bonito. Independentemente das vintenas.

junho 27, 2013

Sussurro da Alma

A minha alma sussurra-te ao ouvido: "Gosto de ti, gosto de ti". E tu te mostras incrédulo. Não consegues conceber a ideia de que as almas também sussurram, no seu silêncio tão próprio. Até mesmo a tua sussurra, embora a tua vontade de a calar permaneça. Comigo, isso não resultou. Eu consigo ouvi-la. E respondo de volta: "Também te amo".

junho 22, 2013

Todo Tu

Todo tu. Todas as letras do teu nome, do teu apelido, da tua caligrafia inquieta. Todo o mel que te escorre dos olhos, toda a displicência dos teus lábios, toda a tua postura, todo tu.

Toda a tua expressão. Todos os fios brancos do teu cabelo. Todos os outros fios, que eu agarro, para não te perder à meada. Todas as tuas marcas. Toda a tua barba desfeita ou até mesmo por desfazer. Todo o teu canto da boca a prender mais um cigarro, o primeiro do maço, o último. Todo o fumo que exalas sem pressa. Toda a aura que te envolve. Todo o teu vestir e despir. Principalmente o despir. Todas as privilegiadas gotas de perfume que povoam o teu pescoço. Todo o fervor que te consome a mente, todo o ardor do teu peito, toda a tua raiva, revolta, toda a tua doçura, calma. Todo o teu riso, toda a tua lágrima disfarçada, todo o teu prazer, toda a tua dor. Todo tu.

Todo o contorno da tua cintura. Todas as veias que pulsam nos teus braços. Toda a tua força e fraqueza dissimulada, toda a tua agilidade. Toda a tua verdade. Toda a tua nudez, toda a tua crueza. Toda a tua liberdade.

Todo tu. Que és todo meu.

junho 21, 2013

Costas Nuas

Estou a ver os traços da tua espinha. Tu para aí ocupado, ou a fingir que estás, para não pensares em nada, e nem te apercebes do deleite que me proporcionas. As tuas costas nuas, cenário perfeito para um passeio de unhas. E agora estás de cigarro na boca. "You delicious bastard". Lembras-te? Eu sim. Espero que te lembres disso e muito mais. Embora agora ache que estás muito mais preocupado em arrumar os CD que tens por aí espalhados do que propriamente em lembrares-te de mim. Ou de nós. Mas aqui estou eu, sentada, a contemplar-te, em silêncio. A ver os traços da tua espinha. Aquela que eu acabo por arrepiar cada vez que te toco. Assim espero que seja. Que o meu toque não tenha sido em vão. Que o tenhas guardado algures em ti. Que não o tenhas transferido para mais lugar nenhum. Nem sequer para os CD. Olha que fico ciumenta, e vai na volta agarro neles e desarrumo-os só para depois ter o prazer de te ver a arrumá-los novamente na estante, de costas nuas para mim. Tal como se estivesses a arrumar o caos dos teus dias, dos teus pensamentos, das tuas frases e afirmações. Sei que não estás. Agora os CD, depois o resto. E depois eu, ou talvez não. Ou talvez sim. Ou então eu, e depois o resto. Quanto a mim, já defini as prioridades: primeiro, contemplar-te. Depois, continuar a adorar-te. E por fim, amar-te, a ti e os traços da tua espinha. E que eu saiba disso.

junho 20, 2013

Tu És Tu

Tu és tu. Não podes, nem deves ser mais ninguém a não ser tu. És um exemplar que não mais se repetirá. Portanto usa-te, aproveita-te antes que expires. Permite-te a isso. Permite-te assentar os pés firmemente no ar, cair ao tentares fazê-lo e fazê-lo uma e outra e outra vez. Goza o teu pleno dever de falhar, de estragar tudo, de fazer merda, para que depois possas usufruir do direito de consertar, reconstruir, limpar e recomeçar, mesmo que depois tenhas que falhar de novo. Dizem que errar uma vez é perdoável, errar segunda já é estupidez. Permite-te então seres um grandessíssimo estúpido. Só assim conseguirás ser inteligente. Se estiveres entre aqueles que rastejam pela vida fora, caminha. Se eles caminharem, corre. Se eles correrem, voa. Mas nunca te conformes. Quem segue um rebanho tem um fim marcado, quem foge dele marca um começo.

Tu és tu. E não eles.

junho 19, 2013

Tela

Acordei ainda um pouco estremunhada de sono. Era Domingo. Era Junho, mas não parecia. Era suposto estar sol, mas não estava. E enquanto não estavas comigo, levantei-me. Fui até à varanda da sala. De facto não parecia estarmos em Junho. O céu cobria-se completamente de nuvens, dando um aspecto ainda mais sombrio à cidade que só por si já o é. Sombria, cinzenta, antiga, tal como o mundo lá fora, que observo através da janela.
Reparei que na tua sala havia uma enorme tela, que tapava quase por completo uma das paredes. Estava torta. Fui lá e endireitei-a. Não gosto muito de ver quadros tortos; sempre ouvi dizer que dão azar. E para além disso, convém que os quadros estejam direitos para que se possa apreciá-los convenientemente, sem correr o risco de ficar com um torcicolo...
Não te pedi autorização para a endireitar. Também não estavas ali. Aliás, talvez a tela estivesse torta de propósito - podias gostar mais dela assim. Contudo, eu achei que devia fazê-lo, e que provavelmente nem te importarias.
Mais tarde, olhando com mais atenção, vi que na tela estavam escritas as seguintes palavras:

ESTRUTURA
EQUILIBRADA
REGULAR
NATURAL
SUPORTA
UNE

E naquele momento, tudo fez sentido. Uma estrutura equilibrada, regular e natural, suporta e une. Por isso, se tiveres mais telas que estejam tortas nas tuas paredes, prontifico-me a endireitá-las. A equilibrar pois as tuas estruturas, torná-las naturalmente regulares, tal como deviam ser. E elas te irão suportar. E elas nos irão unir.

junho 05, 2013

Só Mais Um

Tu fazes-me sorrir. E muito.
Tu fazes-me sentir feliz com pequenas coisas.
Com um telefonema. Com uma piada. Com um olhar.
Com o teu pensamento posto em mim.
Tu fazes-me sentir aquele "eu" que eu era suposto ser.
E fazes tão pouco para que isso aconteça... O que para mim, na verdade, é muito.
Tu fazes-me ansiar por algo muito bom. Como aquela criança que fica fora de si quando sabe que lhe vão dar uma simples guloseima.
Tu és uma guloseima. A propósito, tens uma voz de cana... De açúcar. Porque é doce.
E é a voz que eu não me importaria de ouvir, mesmo que não dissesse nada de jeito...
Eu sei que não devia voltar aos "vómitos literários". Quase que me fizeste prometer que não o faria. Mas não me consigo conter.
Amo, logo escrevo. Portanto, como poderia não te escrever?

Não sei até onde irá a caneta. As palavras.
Vou contudo desamarrá-las e deixá-las seguir o seu curso... Sem medos.
Não sei até onde irei, até onde iremos.
Espero contudo ir, e espero que vás comigo até onde eu for.
Eu gostava de ir longe. De deixar para trás todas as porcarias que minam a minha vida... Queria lavá-la, deixá-la limpa, pronta para te receber nela (meu Deus, isto agora soou um pouco pornográfico, mas "whatever", como tu dizes...).
Bom... Tu no fundo já lá estás, e faço questão que continues. Na minha vida.
E que me dês cada vez mais motivos para "vomitar", para continuar a escrever-te...

Já te disse que me fazes sorrir? E muito?
Por isso é que te dedico este texto. E me dedico. A ti, meu centauro invicto.