abril 15, 2013

Caderno

Na minha estante, entre livros já lidos e relidos e uma ou outra enciclopédia que ajuda a decorar os espaços deixados entre eles, guardo um caderno, de papel com tom amarelecido a sugerir séculos de existência, e no qual escrevo mensagens. Aquelas mensagens especiais que vou recebendo por telemóvel, de amigos, amigas e não só, como forma de me lembrar deles. O caderno tem uma capa dura, de cor bege, tal como se fosse um livro. E apesar de não ter título, acaba por ser um livro, que de vez em quando vou lendo e relendo, como os outros. Conhecem aqueles tipos de obras que uma pessoa lê, chega ao capítulo final e fica com vontade de ler de novo, mesmo que já conheça a história de cor e salteado? É mais ou menos isso. A diferença é que este livro ainda não conheceu um capítulo final. Isto porque há sempre mais uma mensagem para colocar. Ponho o nome do remetente, copio o texto tal e qual como me foi enviado, registo a data e inclusive a hora a que o recebi. E aí permanece conservado para a posteridade, em nome daquela máxima muito bonita que diz "recordar é viver".

E nessa posteridade posso encontrar de tudo: provas de amizade, provas de amor, provas de amizade que deixou de o ser, provas que desaguaram em desamor. Coisas que eram do momento e outras que se poderiam tornar eternas, ou ainda o são. Mas essas são raras. E através da leitura de todas essas provas, assisto à mutação daquilo que não é palpável, perceptível ao tacto, mas que um dia o coração, a alma ou o que lhe quiserem chamar conseguiu captar. E daí eu ter agarrado numa caneta e, de telemóvel em punho, ter feito um esforço para que tudo isso se tornasse palpável aos meus olhos e à minha compreensão. Acho que o esforço me foi recompensado, porque ainda hoje, ao abrir o caderno, consigo tocar nessas mensagens e sentir o que está dentro delas, ou estava.

Falta-me só transcrever as tuas, que já me enviaste há imenso tempo e que ainda guardo no telemóvel. Aquela escrita em quatro línguas, a da transferência efectuada no banco dos afectos, a tua inspirada confissão de desinspiração para escrever mensagens, a tua cómica paixão declarada por estados de espírito "zombie"... Coisas que só tu e eu entendíamos. E que me levaram a pensar: "Estas merecem ir para o caderno". Não foram logo na altura porque apeteceu-me tê-las à mão, para ir relendo e gravando na minha memória afectiva. Não me dá muito jeito andar com o caderno atrás...

Embora esses curtos textos já não sejam aquilo que foram, eu vou escrevê-los no caderno à mesma. E vou tocar muito neles. E sentir o que está dentro deles. Ou estava. Quem sabe até se não poderá voltar a estar...

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